Questões pós ensaio aberto

Hoje fizemos uma pequena mostra do que temos produzido na pesquisa com a presença de alguns amigos, convidados e do público do Centro Coreográfico. Prova-de-fogo à parte (e não menos à parte, o friozinho na barriga), restaram algumas questões que, provavelmente, nos assombrarão/guiarão nas próximas semanas:

1) Informalidade vs formalidade: qual é a medida certa da “distração” de Lispector?

2) Espaço, proximidade e intimidade: onde, a que distância e para quantas pessoas (por vez) mostrar?

3) Como administrar o ego e o auto-encantamento? Como ser mais generoso com quem assiste?

4) Dinâmica, energia e presença: a armadilha do modo automático

5) Manipulação de materiais: e o corpo?

6) A famigerada precisão

7) Memória, tempo, memória…

 

Proposta de banner: Eni

A Ni já produziu algumas imagens para um exercício que propus a ela: criar um banner aqui para o blog. Aqui está a mensagem que ela me mandou esses dias:

“Oi Dré!

Estou mandando a primeira proposta de banner para o Senha. Está em anexo em PDF e em jpg.

Ideia: Fiquei pensando muito sobre pesca, “Pesca milagrosa, de Clarice Lispector”, água, saco plástico (ideia de Aluísio), anzol, palavras e corpo. Então cheguei às composições que estão em anexo.
Usei o saco plástico, que também remeteu a ideia de água (mar, lago, rio…) e por isso a cor azul, o corpo como a “vara de pescar”. No logo, usei a palavra Senha como um “anzol” que pesca a letra “A” da palavra acesso. Isso tudo junto remeteu à ideia de uma memória inventada.
Bom, espero a sua análise e próximas instruções.
Bjs
P.S: As imagens “logo senha de acesso 5 e 6″ também me remeteram à ideia de memória, mas percebi que caem no lugar comum da lembrança, fotografia e blá, blá, blá… Mas estão aí como um exercício.”
Ni, prometo responder em breve com mais calma, mas já adianto que gosto da concepção da logo em si, da pesca da letra A. Legal!!!
Aqui embaixo, algumas imagens que ela enviou:

Briefing Eni

1- O que te inspirou a começar este projeto?

Eu queria retomar uma ideia que surgiu lá em 2003, quando passei o ano criando o que viria a ser o “Fugacidades”. Eu chamava de “rascunhos” a maneira como os bailarinos faziam para lembrar as sequências de movimentos que eles tinham criado em ensaios anteriores.

No projeto [Senha] eu quis usar a palavra “memória” em vez de “rascunho”. No fundo, é mesmo uma questão relacionada à memória – tenho me dado conta disso a cada encontro com os bailarinos (e contigo, inclusive).

2- Problema ( O que você espera ser resolvido nesta pesquisa)?

Não sei se “resolvido” é a palavra, já que se trata de uma pesquisa artística, mas espero fazer algumas descobertas relacionadas a que potencial a memória tem como ponto de partida para uma criação na área de dança.


3- Qual o objetivo deste projeto? Qual seu diferencial perante outros?

Acho que já respondi, de alguma maneira, na pergunta anterior. O diferencial do “Senha” é justamente o tratamento dado à memória. Não estou interessado em representar lembranças, em contar através de movimentos o que aconteceu comigo, ou com o Alu, etc. Estou interessado em me fazer a pergunta: “Como usar essas lembranças como estimuladores num processo de criação em dança?” Nesse sentido, os “memoráveis” são uma maneira de exercitar tal estímulo.

4- Como você chegou ao nome “Senha de Acesso” para este projeto?

Risos! Boa pergunta!

Na verdade, nem lembro mais… mas a ideia é essa mesmo, de pensar a memória como senha de acesso a uma dimensão criativa que a gente ainda vai descobrir durante o processo. Tem tudo a ver com aquela conversa sobre o texto da Clarice [Lispector], lembra, “de usar a palavra [o instrumento, a vara] para pescar a não-palavra”.

5- O que você quer dizer?

Acho que está aí em cima…

6- Qual é o foco da mensagem que você quer passar?

No momento, gosto dessa metáfora da pesca.

É como se a gente estivesse fazendo um exame muito sensível dos nossos corpos em busca de um chackra ainda não descoberto, um ponto G ou X ou Z, e que ao pressionarmos esse botão… plaft!… algo especial acontece e se concretiza no trabalho q essa pesquisa toda vai gerar. Eis outra metáfora q talvez a inspire…


7- Palavras-chave?

Memória, memorável, corpo, pesca, pesquisa, exame, botão de acesso, senha de acesso, plaft… risos

A pesca milagrosa, de Clarice Lispector

Então escrever é o modo de quem tem a palavra como isca: a palavra pescando o que não é palavra. Quando essa não palavra morde a isca, alguma coisa se escreveu. Uma vez que se pescou a entrelinha, podia-se com alívio jogar a palavra fora. Mas aí cessa a analogia: a não palavra, ao morder a isca, incorporou-a. O que salva então é ler “distraidamente”.

Sobre memória (3)

LEMBRAR-SE

Escrever é tantas vezes lembrar-se do que nunca existiu. Como conseguirei saber do que nem ao menos sei? assim: como se me lembrasse. Com um esforço de “memória”, como se eu nunca tivesse nascido. Nunca nasci, nunca vivi: mas eu me lembro, e a lembrança é em carne viva.

— Em Para não esquecer, de Clarice Lispector